Bebidas e preparos culinários costumam estar rodeados de
história. E também de histórias, umas mais interessantes, outras simples. É o
caso do vinho. A macro história do vinho é fascinante. Ela pode ser comparada a
um grande guarda-chuvas que abriga centenas/milhares de pequenas histórias.
Pude vivenciar uma dessas pequenas histórias dia desses,
quando tomei um agradável vinho branco da Croácia, o Posip Cara 2013, feito com
a uva autóctone Posip. Um vinho da ilha de Korcula, costa da Dalmácia, no mar
Adriático, elaborado com uvas do vinhedo Cara pela “Posip” Cooperativa
Agrícola. Uma área com indicação protegida, cravada na ilha apontada por
historiadores como o possível lugar de nascimento do navegador Marco Polo.
Peguei a garrafa com uma boa dose de expectativa e um toque
de ceticismo. Costumo ter esses dois sentimentos quando olho o rótulo de um
vinho que desconheço. Vinho é expectativa. E antes de abri-lo, começo a
imagina-lo. O que me espera? Um grande vinho, um vinho cotidiano, um vinho
diferente? Isso é fascinante. O Posip Cara 2013 é feito com a casta branca
Posip. Gosto das uvas autóctones. Elas são identificadas com áreas únicas de
produção. E geram vinhos igualmente únicos. A Posip foi considerada durante
muito tempo uma uva secundária. Mas teve seu valor reconhecido e hoje é vista
como uma branca notável, a partir de seu país de origem.
A vitivinicultura, na Croácia, foi implantada pelos gregos
há cerca de 3 mil anos. O período coincide com a vitivinicultura grega no sul
da Itália, no território da Enotria. São países vizinhos. Outros povos
habitaram a região: ilírios, romanos, godos e bizantinos. O vinhedo de Cara
está localizado a 3 quilômetros do mar e goza de um clima mediterrâneo, com
invernos frios, primaveras às vezes chuvosas, verões longos e quentes e outonos
frescos. É nesse cenário que a Posip frutifica.
Outra uva autóctone croata, esta tinta, é a Plavac-Mali, um
cruzamento natural da Crljenak Kastelanski (Zinfandel) com a casta Dobricik.
Uma variedade que gera vinhos complexos e estruturados, que hoje começam a
ganhar e conquistar apreciadores da bebida pelo mundo.
Depois de me informar sobre esse contexto, cravei o
saca-rolhas na cortiça e comecei meu ritual de abertura do Posip Cara 2013.
Estava na hora de desvendar o vinho. Tirei a cortiça, de boa qualidade, e servi
uma pequena dose no copo. A cor mostrou-se atraente, um amarelo já com notas
douradas, o aspecto límpido e brilhante. Gostei. Os aromas foram se revelando.
Primeiro, notas frutadas de pêssego e damascos. Em seguida, agradáveis aromas
cítricos, inclusive um cítrico doce, lembrando limão confitado. Ao fundo, uma
sutil nota verde. E, por último, notas amendoadas. Um vinho de perfumes
agradáveis.
A boca confirmou o nariz e mostrou-se fresca, frutada e
cítrica. O vinho revelou untuosidade no paladar, uma conjugação de frescor e
maciez. As notas amendoadas do nariz confirmaram-se no final de boca. Um vinho
de persistência média/longa, bastante agradável, equilibrado e
harmônico.
Combinei o Posip Cara 2013 com um suculento e perfumado spaghetti ai frutti di mare. Um
casamento sem risco de erro. Ficou delicioso. Aromaticidades compatíveis e
limpeza perfeita do paladar. Este é um vinho sinérgico aos preparos com
pescados e frutos do mar. Um vinho para o verão, para o clima e receitas
litorâneas brasileiras.
Fiquei satisfeito. Descobri um novo vinho, de uma uva
autóctone. Mergulhei em mais um pequeno espaço do macrocosmo vitivinícola. E
tive o prazer de saborear não apenas a bebida, mas também sua história e
particularidades. Algo que tornou o rótulo, sem dúvida alguma, mais
interessante. Minha maneira particular de provar e buscar conhecer um pouco
mais da cultura desse e outros vinhos. Um prazer além do rótulo.
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